quarta-feira, 18 de março de 2015

Calle sin salida

Há quem se entedie em cidades pequenas. A mim, me angustiam as grandes cidades, o desacolhimento das largas avenidas, a solidão dos transeuntes, a pressa sem destino, e, por fim, essa multiplicidade indesfrutável. Para que tantos caminhos diversos se só um podemos percorrer? A vida na capital e essa necessidade de excessos de quem não consegue conviver com a doçura de sua pequenez.

Fujo para os parques, qualquer verde me abranda, mas não é esse verde que preciso, as árvores cercadas de tanto cimento se entristecem, desbotam a aura, perdem a cor e ganham tom de verde-cinzento/cimento. 

Aqui, me escondo do cinza na pequena Bellavista, basta-me esse mínimo quarteirão no alto do bairro em Fernando marques de la plata. À esquerda, La Chascona, casa onde morou Neruda e Matilde, à direita, uma galeria de arte muito simpática que parece extrair o melhor do lugar. Moro aqui por alguns dias em um quadrado alto de poesia cercado por casas coloridas e silêncio, o burburinho da boêmia me chega de longe, mas não é mais alto que a poesia silente que esta rua me diz. 

Ao dobrar a minha esquina, uma plaquinha anuncia: "calle sin salida". Hoje entendo a placa, Neruda é caminho sem fim. Daí porque só escrevia com tinta verde. Ele se sabia eterno. Usava a cor da natureza para que suas palavras estivessem vivas e crescessem em nós, como crescem as árvores.

Tem sido assim todo dia, descobri aqui que a palavra tem cor e da minha janela vejo a poesia germinar em tinta verde, não há muitas árvores no quarteirão, mas o verde aqui é mais vívido que em qualquer lugar de Santiago.

Santiago, 02 de janeiro de 2015.

Um comentário:

Lívia (Liv´s de Lórien/Liv´s From Lórien) disse...

Que lindo! Ressuscitou o Aleph! E vc está morando no Chile?

Voltei aqui devido ao seu comentário no meu blog! Grande prazer em revê-la e lê-la!

Abs.


Lívia